Bardos e Trovadores

A força metálica das palavras primitivas faz a superioridade dos restos das épocas grosseiras.

É demandado pouco talento do jovem bardo para se entoar cânticos mais impressionantemente do que é demandado dos poetas mais tardios e mais cultivados. A vantagem dele é que é as palavras dele são coisas, cada uma o som sortudo que descreve o fato, e ouvimos a ele como ouvimos ao indiano, ao caçador ou ao mineiro, cada um representando seus fatos tão fielmente quanto o uivo do lobo ou da águia diz sobre a floresta, ou o ar que eles habitam.

A força original, o cheiro direto da terra ou do mar, é nestes poemas antigos, o Sagasof The North, o Nibenlugenlied173, as canções e baladas dos ingleses e dos escoceses.

Eu encontro ou fantasio mais poesia verdadeira, o amor pelo vasto e o ideal, nos fragmentos galeses e bárdicos de Taliesin174 e seus sucessores, do que em muitos volumes de clássicos britânicos. Uma grandiloquência intrépida aparece em todos os poetas, como:

 

“Todo o oceano ardia como uma única ferida” – Ragnar Lodbrok175

 

“O próprio Deus não pode conquistar o bem através do mal” – Welsh Triad176

 

Um espécime favorável na vocação do Wind177 de Taliesin nas portas do Castelo Deganwy178:

 

“Descubras tu o que é,

Ele, criatura forte de antes da enchente,

Sem carne, sem osso, sem cabeça, sem pés,

Ele não será nem mais velho nem mais novo do que no começo;

Ele não tem medos, nem as vontades grosseiras das coisas criadas.

Bom Deus! Como o mar fica branco quando ele vem!

Ele está no campo, ele está na floresta,

Sem mão, sem pé,

Sem idade, sem estação,

Tem sempre a mesma idade com a idade das idades

E de igual largura à superfície da terra,

Ele não nasceu, ele não vê,

E não é visto; ele não vem quando desejado:

Ele não tem forma, ele não carrega nenhum fardo.

Pois é o vazio do pecado.

Ele não causa perturbações nos lugares onde Deus decide,

No mar, na terra”.

 

Em um dos poemas dele, ele pergunta:

 

“Há apenas uma maldição no vento?

Apenas uma na água do mar?

Há apenas uma fagulha no fogo da energia ilimitada?!”

 

Ele fala de seu herói, Cunedda179:

 

“Ele assimilará, ele concordará com o profundo e com o superficial”.

 

Para outro:

 

“Quando eu falhar em uma palavra pecaminosa,

Que você, nem os outros, possam ouvir”.

 

De um inimigo:

 

“O caldeirão do mar foi delimitado redondo por esta terra, mas não cozinharia a comida de um covarde”.

 

Para um exilado em uma ilha ele diz:

 

“A pesada corrente azul do mar fizeste tu, ó mero homem, aguente”.

 

Outro bardo em tons parecidos diz:

 

“Eu tenho a posse de canções tais quais nenhum filho de nenhum homem pode repetir; uma delas é chamada de ‘O Ajudante’; ajudará a ti e tuas necessidades na doença, no luto e em todas as adversidades. Eu conheço uma canção que eu preciso cantar apenas quando os homens me carregaram com obrigações: quando a canto, minhas correntes caem em pedaços e eu caminho em frente até a liberdade”.

 

Os nórdicos não têm menos fé na poesia e em seus poderes, quando eles descrevem-na assim:

 

“Odin falava tudo em rima. Ele e seus deuses eram chamados de ‘ferreiros de canções’. Ele podia deixar seus inimigos na batalha cegos ou surdos, e suas armas tão cegas que eles não podiam cortar mais do que um galho de salgueiro. Odin ensinou estas artes em runas ou canções, que são chamadas de encantamentos”.

 

As cruzadas fizeram surgir o gênio da França, no século doze, quando Pierre d’Auvergne180 disse:

 

“Eu cantarei uma nova canção que ressoa em meu peito: nunca foi uma canção tão boa ou linda que se assemelhava com qualquer outra”.

 

E Pens de Capdeuil181 declara:

 

“Já que o ar se renova e se suaviza, meu coração também deverá se renovar, e o que brota nele brotará e crescerá fora dele”.

 

Há em todo poema um apogeu que atrai mais do que outras partes, e é melhor lembrado. Assim, em Morte d’Arthur182, não me lembro de nada tão bem quanto à negociação de Sir Gawain183 com Merlin184 em sua maravilhosa prisão:

 

“Depois do desaparecimento de Merlin da corte do Rei Arthur ele fez séria falta, e vários cavaleiros saíram em busca dele. Dentre outros estava Sir Gawain, que continuou em sua busca até que fosse a hora de voltar para a corte. Ele foi até a floresta de Broceliande, lamentando conforme prosseguia.

Em breve ele ouviu a voz de alguém gemendo perto de sua mão direita; olhando naquela direção, ele não podia ver nada, salvo uma espécie de fumaça que parecia ar, e através da qual ele não conseguia passar; e este impedimento o deixou tão colérico que o privou de fala.

Em breve ele ouviu uma voz que dizia ‘Gawain, Gawain, não seja sem coração, pois tudo que precisa acontecer vai acontecer’. E quando ele ouviu a voz assim, chamá-lo assim pelo nome certo, ele respondeu, ‘Quem pode ser este que falou comigo?’. ‘Como’, disse a voz, ‘Sir Gawain, você não me conhece?’ Você foi escolhido para me conhecer bem, mas por conseguinte as coisas estão entrelaçadas e assim o que o provérbio diz é verdade, ‘Deixe a corte e a corte deixará você’. Também é assim comigo. Enquanto eu servi o Rei Arthur, eu era bem conhecido por você e por outros barões, mas por que eu deixei a corte, não mais sou conhecido, e colocado no esquecimento, onde eu não ficarei se a fé reinasse no mundo’. Quando Sir Gawain ouviu a voz que falava com ele assim, ele achou que fosse Merlin e respondeu, ‘Sir, indubitavelmente eu hei de conhecê-lo bem, pois muitas vezes ouvi suas palavras.

Imploro para que apareça à minha frente para que eu possa reconhecê-lo’. ‘Ah, Sir’, disse Merlin, ‘você nunca mais me verá, e isso me entristece, mas eu não posso solucionar isso, e quando você partir deste lugar, eu nunca mais falarei com você nem com nenhuma outra pessoa, exceto apenas com a minha senhora; pois nunca mais nenhuma outra pessoa será capaz de descobrir este lugar por causa de qualquer coisa que possa vir a acontecer; nem tampouco eu jamais sairei daqui, pois no mundo não há torre tão forte como esta na qual estou confinado; e não é nem de madeira, ferro ou pedra, mas de ar, sem mais nada; e feita por um encantamento tão forte que não poderá jamais ser demolida enquanto o mundo continuar existindo; nem eu posso sair, nem ninguém pode entrar; exceto ela que me prendeu aqui e que me faz companhia quando eu a agrado: ela vem quando ela se apraz, pois a vontade dela está aqui’.

‘Como, Merlin, meu bom amigo’, disse o Sir Gawain, ‘você está tão preso que você não consegue entregar-se nem fazer-se visível para mim; como isto pode acontecer, dado que você é o homem mais esperto do mundo?’ ‘Preferencialmente’, disse Merlin, ‘o maior tolo: pois eu sabia que tudo isso aconteceria comigo, e eu fui tolo o suficiente de amar outro mais do que a mim mesmo, pois eu ensinei minha senhora que pelo que ela me aprisionou de tal forma que ninguém pode me libertar’. ‘Indubitavelmente, Merlin’, respondeu Sir Gawain, ‘disso eu sinto muito, e também o sentirá o Rei Arthur, meu tio, quando ele souber, como sendo alguém que busca por você por todas as terras’. ‘Bem’, disse Merlin, ‘isto deve ser dito, pois ele jamais me verá, nem eu a ele; nem ninguém falará comigo novamente depois de você, seria em vão tentar fazê-lo; pois você mesmo, quando você se virar, jamais será capaz de encontrar o lugar: mas cumprimente por mim o rei, a rainha e todos os barões, e diga a eles de minha condição.

Você encontrará o rei em Carduel em Wales; e quando chegar lá você encontrará todos os companheiros que partiram com você, e que neste dia voltarão. Agora vá em nome de Deus, que protegerá e salvará o Rei Arthur, e o reino de Logres, e você também, como os melhores cavaleiros que há no mundo’. Com isso Sir Gawain partiu alegre e infeliz; alegre por causa do que Merlin havia garantido que aconteceria com ele, e infeliz por que por conseguinte Merlin havia sido perdido”.

Criação