Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.
© 2010 Sabrina Philips. Todos os direitos reservados.
UMA ESPOSA REBELDE, N.º 1358 - Janeiro 2012
Título original: Greek Tycoon, Wayward Wife
Publicado originalmente por Mills & Boon®, Ltd., Londres.
Publicado em portugués em 2012
Todos os direitos, incluindo os de reprodução total ou parcial, são reservados. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Enterprises II BV.
Todas as personagens deste livro são fictícias. Qualquer semelhança com alguma pessoa, viva ou morta, é pura coincidência.
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I.S.B.N.: 978-84-9010-641-9
Editor responsável: Luis Pugni
ePub: Publidisa
– Receio, senhor Delikaris, que ainda continue atrás de Spyros nas sondagens.
Orion observou o gráfico que se projetava na parede e observou a expressão pessimista do seu diretor de campanha, que estava sentado junto dele na mesa de reuniões. Uma expressão de contrariedade desenhou-se no seu rosto. Orion era um homem habituado ao êxito e isso era o que esperava de todas as pessoas da sua equipa. Era para isso que lhes pagava.
– Encurtámos, no entanto, a vantagem que vos separava – continuou o homem, um pouco nervoso, vendo a expressão descontente de Orion. – O último ponto da campanha, baseado num programa de investimento para ajuda às moradias e à construção de um novo hospital, deu os seus frutos. Só que não chegou a alcançar os objetivos que tínhamos marcado.
Carregou no comando à distância que tinha na mão e apareceu um novo gráfico a apoiar as suas palavras, mas que só contribuiu para irritar ainda mais Orion, já que mostrava as diferenças das predições da sua equipa.
– Portanto, apesar do esforço que fizemos para acomodar as nossas políticas às necessidades de Metameikos, um homem que é tão corrupto como o seu pai, continua a ser o candidato mais popular, não é assim? – perguntou Rion, beliscando a ponte do nariz e olhando, muito sério, para todos os assistentes. – Alguém pode dar-me uma explicação?
Fez-se um silêncio comprido e tenso que foi finalmente quebrado por uma voz de um extremo da mesa.
– Talvez os cidadãos não sintam uma ligação consigo.
Todos os membros da equipa sustiveram a respiração. Rion levantou lentamente a cabeça para ver quem falara. Era Stephanos, um assistente do seu gabinete de imprensa, recrutado recentemente para a sua campanha. Era o mais novo da equipa.
– Está bem, dê-me a sua opinião.
– As pessoas pensam em si como um solteiro multimilionário que decidiu da noite para o dia transformar-se num líder político – Stephanos fez uma pausa, esperando alguma palavra de recriminação por parte de Rion que não chegou. Depois, continuou a sua exposição. –As suas promessas podem preencher as necessidades dos cidadãos, mas os resultados mostram claramente que as pessoas não esperam que as cumpra. Talvez pensem que isto é apenas um jogo para si, um mero capricho, para se demonstrar que pode ter êxito em qualquer área que queira. Talvez pensem também que, tendo em conta os seus negócios em Atenas, não poderia dedicar o tempo necessário a desempenhar eficazmente o seu trabalho. Coisa que, obviamente, não é verdade, mas eles não sabem. As pessoas preferem votar no mau conhecido do que no bom desconhecido.
Rion observou Stephanos atentamente. O rapaz tinha coragem. Gostava disso. Fazia-o pensar em si próprio noutros tempos. Ele também sabia que o mundo da política era muito diferente do dos negócios, que as pessoas votavam com o coração e não com a cabeça, mas o que não pensara fora que as pessoas poderiam vê-lo como um ambicioso.
– E o que tenho de fazer?
Os membros da equipa entreolharam-se com um ar de perplexidade. O seu chefe de campanha parecia ofendido.
Stephanos respirou fundo e continuou.
– Para que as pessoas tenham confiança em si, precisam de o ver como uma delas. Ver que as suas preocupações, os seus princípios e os seus problemas, são os mesmos que os delas, que participa nos velhos valores tradicionais gregos.
– Eu fui criado em Metameikos – disse Rion, muito sério. – Fui educado com esses valores tradicionais de que fala e, com eles, cheguei onde estou agora.
– Então, convença as pessoas de que continua a pensar da mesma forma – replicou Stephanos, com entusiasmo. – Que a casa que comprou lá não é apenas mais uma propriedade, mas que tenciona estabelecer lá a sua residência.
– E como sugere que faça isso?
– Quer que seja sincero? – perguntou Stephanos, num tom de indecisão. – Penso que a melhor solução seria voltar para Metameikos com uma esposa.
A expressão recetiva de Rion desapareceu imediatamente e o seu rosto toldou-se subitamente.
– Isso é inaceitável. Espero que tenha uma alternativa.
Extasiada, Libby olhou para o logótipo espetacular em 3D da empresa Delikaris a girar ostentosamente à frente das portas giratórias de vidro da entrada e pensou mais uma vez que estava a fazer o correto. Era a mesma coisa que pensava desde que a tinham chamado para substituir Zoe, como guia turística pela Grécia, durante a sua licença por maternidade.
Estivera, no entanto, à procura de desculpas durante toda a semana para não aparecer em Atenas e, agora, sentia a tentação de se virar e fugir. Mas sabia que seria ridículo. Estava a fazer o correto. Já era hora de ambos refazerem as suas vidas de uma vez por todas. Que outra coisa podia fazer depois de passar cinco anos sem falar com Rion?
Estar novamente em Atenas, voltar a ver a cidade e o antigo bloco de apartamentos trouxera-lhe velhas lembranças. Mas era apenas isso, lembranças. Sentia-se assim porque não tinham voltado a ver-se e ainda recordava o homem por quem uma vez estivera apaixonada, embora provavelmente nem sequer o reconhecesse agora quando o visse.
Devia estar muito mudado. Tal como ela. Enquanto ela estivera fora, a trabalhar como guia turística em viagens de baixo custo por todo o mundo, sem outra coisa senão o seu livro na mão e a sua mochila às costas, ele devia ter passado todos aqueles anos a trabalhar arduamente para conseguir forjar aquele império.
Seria por isso que nem os seus advogados nem ele tinham chegado a entrar em contacto com ela? Estivera tão perdido no seu trabalho que ignorara todas as questões legais?
Quando Libby decidiu finalmente atravessar a porta, deu por si num vestíbulo da receção muito espaçoso e cheio de luz.
– Posso ajudar? – perguntou uma rececionista elegante, olhando com um ar indulgente para o seu vestido solto e simples e as suas sandálias rasas de couro.
Libby olhou à sua volta e apercebeu-se de que era a única mulher no vestíbulo concorrido da entrada que não tinha um vestido elegante e uns sapatos de agulha de, pelo menos, dez centímetros. Mas não deixou que isso a intimidasse.
– Queria ver Orion Delikaris…
– Tem reunião marcada?
Libby sabia que tentar falar com ele no seu escritório era quase uma missão impossível, mas sem a sua morada nem uma forma de a conseguir, não tivera outra alternativa.
– Não, mas como é a hora do almoço pensei que…
A rececionista fez um gesto negativo com a cabeça e sorriu ironicamente.
– O senhor Delikaris não faz nenhuma pausa para almoçar. É um homem muito ocupado.
Libby não precisava que lho recordassem. Não podia haver um homem mais ocupado do que ele em todo mundo. Mas, possivelmente, depois de cinco anos, podia dedicar-lhe dez minutos…
– De todos os modos, seria suficientemente amável para avisar o senhor Delikaris e deixar que ele decida se quer receber-me ou não? – pediu Libby, com doçura, mas com firmeza.
Ela negociara em certa ocasião o aluguer de vinte e dois camelos para poder fazer uma visita noturna através do deserto que a agência tinha programado e poder resolver assim a avaria imprevista do autocarro destinado a tal fim, portanto não ia deixar-se intimidar agora por uma jovenzinha.
A rececionista suspirou com ceticismo, pegou no telefone com uma das suas mãos cuidadas e carregou num botão com o dedo.
– Electra, querida, lamento incomodar-te, mas tenho aqui uma mulher que insiste que quer ver o senhor Delikaris. Hum… Sim, outra… Enfim, tem a esperança de que, se ele souber que está aqui, se digne recebê-la… Sim, vou perguntar… Qual é o seu nome, por favor? – perguntou a jovem, virando-se para Libby.
– O meu nome é Libby Delikaris. Sou a sua esposa.
O silêncio mais absoluto apoderou-se da sala de reuniões.
– Receio que não tenha nenhuma alternativa – respondeu Stephanos. – Pode passar o tempo que quiser em Metameikos, a apoiar as empresas da cidade, a assistir aos eventos locais e a tentar conseguir a amizade do vereador, mas penso que nada disso convencerá as pessoas de que tem realmente intenção de se estabelecer lá. Só confiariam em si se o vissem casado e de braço dado com a sua esposa.
– Não entendeu? – perguntou Rion, com um ar de desgosto. – Não quero voltar a ouvir falar disso.
Stephanos ficou surpreendido ao ver que o homem que jurara fazer tudo para ganhar aquelas eleições se recusava de forma tão categórica a considerar sequer a sua proposta, mas decidiu que seria mais prudente não insistir.
– Bom, a verdade é que também não teria sido uma garantia. Aparecer casado, da noite para o dia, com uma mulher com quem não tivera um noivado sério durante alguns anos poderia parecer um ardil publicitário, sobretudo agora, tão perto das eleições.
Naquele momento, ouviu-se o intercomunicador que havia junto de Rion.
– Sim? – replicou ele, num tom de voz cortante.
– Lamento muito interromper, senhor Delikaris, mas há uma mulher no vestíbulo da receção que insiste em falar consigo.
– E de quem se trata, se é que pode saber-se?
Houve uma pausa tensa e prolongada.
– Diz que se chama Libby Delikaris e que é… a sua esposa.
Rion ficou imóvel. Não conseguia mexer-se. Estava paralisado por uma onda de satisfação que o embriagava naquele momento. Voltara.
Era um momento que esperara com ansiedade durante muito tempo, possivelmente demasiado. E não porque se importava com o que ela podia dizer-lhe, pensou para si, mas porque agora, finalmente, podia cumprir a sua vingança.
Levantou-se da cadeira com ar vitorioso, olhando para os membros da sua equipa pelo canto do olho. De repente, apercebeu-se do momento tão oportuno que ela escolhera para voltar a vê-lo, exatamente quando mais precisava de ter uma imagem de homem de valores tradicionais gregos. Os seus olhos ganharam um brilho especial e a sua boca esboçou um sorriso mordaz. Sim, chegara no momento mais adequado!
– Obrigado. Mande-a entrar – disse Rion muito sereno, carregando no botão do intercomunicador.
Percebeu a cara de surpresa de todos os que estavam sentados à volta da mesa. Era compreensível, pois nunca a mencionara. Não gostava de falar dos seus fracassos nem do passado e ela fazia parte de ambas as categorias. Por isso tentara não pensar sequer nela. E, às vezes, até conseguira.
– Peço-vos desculpas, senhores, mas receio que tenhamos de continuar esta reunião noutro momento.
Os homens saíram da sala sem dizer uma palavra. Todos, menos um: Stephanos.
– Sabe? Acabei de pensar numa forma alternativa de convencer as pessoas de que é do tipo de pessoas responsáveis em que podem confiar – disse Stephanos, com ironia, olhando para Rion nos olhos, enquanto se dirigia para a porta, andando para trás. – Não há nada que derreta tanto os corações como um reencontro e uma reconciliação.
Libby não usava o sobrenome do seu marido há cinco anos, nem se apresentara como sua esposa em nenhum sítio durante todo aquele tempo. E, a julgar pela cara de surpresa da rececionista, Rion também nunca a mencionara. No entanto, a ordem determinante que a jovem recebera do senhor Delikaris para deixar aquela mulher entrar no seu escritório não deixava lugar para dúvidas sobre a sua identidade. Em poucos segundos, a jovenzinha prepotente transformou-se na personificação da amabilidade e da cortesia. Libby disse-lhe que preferia não usar o elevador e explicou-lhe com todo o detalhe como subir pelas escadas para o escritório de Delikaris, localizado no último andar do edifício.
Enquanto subia as escadas, Libby tentou ignorar a angústia que sentia e que parecia embargá-la. Tinha de se controlar. Se alguma vez houvera alguma coisa entre eles, já morrera há muito. Tinha de deixar as emoções de lado. Tentou convencer-se de que aquilo ia ser apenas uma formalidade, uma simples conversa amistosa entre duas pessoas que se tinham conhecido no passado, mas que agora eram virtualmente estranhos um para o outro. Possivelmente, quando tudo acabasse, sentiria essa sensação de liberdade plena que sempre procurara, mas nunca conseguira encontrar. Tentou agarrar-se a essa ideia ao chegar ao andar superior. Passou junto de um terraço amplo que parecia uma pista de aterragem para helicópteros e, depois, através de um corredor comprido até encontrar uma porta grande de mogno onde se lia o nome de Orion Delikaris em letras douradas. Bateu suavemente.
– Entre.
Assim que entrou e o viu, Libby compreendeu que tudo o que pensara enquanto subia as escadas, sobre as suas emoções mortas, fora uma estupidez.
Orion Delikaris continuava a parecera-lhe o homem mais desejável sobre a face da terra. Esperara que a idade e o dinheiro tivessem produzido nele umas certas alterações. No entanto, para sua surpresa, tudo nele, exceto o fato tão caro que vestia, estava exatamente igual a como ela o recordava. O seu queixo forte e orgulhoso, o seu cabelo preto e brilhante, e aqueles olhos castanhos como o chocolate líquido que tinham alimentado as suas fantasias de rapariga e aceso a sua paixão de mulher. Aqueles olhos que a tinham observado com amor no dia do seu casamento e com desejo de noite.
Pestanejou, confusa, tentando afastar essas lembranças. Sentiu novamente o impulso de fugir de si própria e daqueles pensamentos.
– Olá, Rion – conseguiu dizer.
Rion percorreu-a com o olhar, incomodado consigo próprio ao verificar a excitação que continuava a causar nele depois de tantos anos. Mas pensou que era apenas porque ainda continuava a vê-la como a mulher que o rejeitara. Assim que começasse a pedir-lhe para voltar para ela, o seu desejo desapareceria. No entanto, incomodava-o que aparecesse ali daquela maneira e especialmente com aquele aspeto tão… diferente. Já não tinha aquele cabelo loiro e sedoso que lhe caía pelos ombros, agora tinha o cabelo muito curto e com um estilo que ele considerava muito pouco feminino embora, no entanto, destacasse a delicadeza das suas feições. E aquela figura pequena e pálida, que uma vez o cativara, dera lugar a um corpo mais excitante, cheio de curvas sensuais e sedutoras, sobre uma pele torrada e dourada pelo sol.
Cerrou os dentes. Certamente, teria passado a vida de festa em festa, disse-se ele. A apanhar sol e a mostrar o seu corpo nas praias das Caraíbas e a ir às compras em lojas exclusivas dos grandes estilistas de moda, com o dinheiro dos seus pais. Isso explicaria tudo. Ainda que, pensando bem, essa imagem não parecesse encaixar muito bem com a roupa que vestia naquele momento. Talvez a empresa do seu pai, a Ashworth Motors, estivesse a passar dificuldades económicas. Por um instante, desejou que assim fosse. Isso faria com que fosse mais fácil lidar com ela.
– Diz-me – disse ele, incapaz de compreender a razão por que demorara tanto a chegar ao seu escritório. – Onde te meteste?
Libby ficou surpreendida com a pergunta e com a sua expressão séria muito perto da hostilidade, mas pensou que, afinal, era compreensível. Ela tinha vantagem. Tivera tempo para se preparar mentalmente para aquele encontro, coisa que ele não pudera fazer.
– Subi pelas escadas – respondeu ela, olhando para o relógio da parede e estimando que teria demorado cerca de cinco minutos.
E quase acrescentou: «Sabes que não gosto de elevadores.» Mas recordou que ele não sabia. Na verdade, ele quase não chegara a saber nada dela. E ela também não sabia muito dele.
E agora sabiam ainda menos um do outro. Eram como dois estranhos.
– Rogo-te que me desculpes se não cheguei num bom momento.
– Exatamente o contrário – disse ele, com um sorriso irónico. – Chegaste no momento oportuno. Na verdade, Liberty, passei anos à tua espera.
Libby sentiu vontade de o corrigir, de lhe dizer que nunca mais voltara a permitir que a chamassem pelo seu nome completo, mas aquelas palavras, dizendo que passara anos à espera dela, tinham parecido uma música celestial para o seu coração e decidiu deixá-lo para uma melhor ocasião.
– Quer dizer que tentaste entrar em contacto comigo? Lamento. Se soubesse… Estive a viajar pelo estrangeiro durante quase todo este tempo. Passei mais de três anos sem consultar as notificações dos bancos. Tenho de começar a pôr-me em dia.
– Se quisesse localizar-te, certamente, teria conseguido fazê-lo.
Mas ele não quisera encontrá-la. Para quê? Sempre soubera que acabaria por voltar, por se arrastar aos seus pés, e assim teria a oportunidade de gozar daquele momento que tanto esperara, de cumprir a sua vingança e vê-la humilhada como o humilhara a ele no passado. Sim, demorara muito a voltar, mas ele não teria trocado aquele momento por nada do mundo, mesmo que tivesse de esperar cinquenta anos.
– Esperava que tivesses vindo ver-me quando o meu nome apareceu pela primeira vez no Ranking Internacional de Milionários – disse Rion, com ironia. – Ou será que esperaste até aparecer entre os dez primeiros?
Libby franziu o sobrolho. Compreendeu que ele pensava que voltara ali por causa do seu dinheiro. Olhou para ele com um ar de incredulidade e, naquele momento, apercebeu-se de que a sua primeira impressão ao vê-lo não fora muito acertada. Mudara. Tornara-se mais duro e cínico. Talvez devesse sentir-se aliviada por ser realmente aquele estranho que imaginara, mas, em vez disso, sentiu-se triste.
– Eu não leio esse tipo de coisas. Nunca o fiz.
Rion percorreu a sala com o olhar e, depois, o terraço ajardinado e a vista esplêndida da Acrópole que se adivinhava através das grandes janelas do seu escritório.
– Queres fazer-me acreditar que não sabias do meu novo estatuto social? – perguntou Rion, arqueando uma sobrancelha.
– Claro que conhecia os teus êxitos profissionais. Mas isso não tem nada a ver com a razão da minha visita.
Rion deixou escapar uma gargalhada depreciativa. Aos seus olhos, continuava a ser, em muitos sentidos, a mesma Liberty Ashworth de sempre. Ainda continuava a afirmar que o dinheiro não significava nada para ela. Isso explicaria o aspeto de peregrina com que aparecera. Era evidente que o vestido e as sandálias faziam parte de um plano perfeitamente concebido para tentar convencê-lo de que ela não sentia nenhum apego pelas coisas materiais.
– Pode saber-se então qual é a razão por que voltaste? – perguntou ele, arrastando as palavras com ironia.
Libby respirou fundo, consciente da importância do momento.
– Estou aqui porque passaram cinco anos e devíamos ter posto isto em ordem há já muito tempo – respondeu ela, muito serena, tirando uns documentos e deixando-os sobre a mesa.
Rion não compreendeu, ao princípio, do que estava a falar. Estava absorto a observá-la, a ver o rubor que aparecera nas suas faces e a tentar adivinhar durante quanto tempo seria capaz de continuar a representar aquela farsa. Mas, quando se apercebeu de que ela estava à espera da sua resposta, baixou o olhar para a mesa e viu a capa do documento.
«Pedido de divórcio.»
Libby teve um sentimento de culpa ao ver a expressão de incredulidade e de espanto no seu olhar. Rion ficou a olhar para aquelas três palavras e sentiu uma mistura de fúria e indignação. Mas só durou um instante.
Estava claro. Apesar de tudo o que conseguira, de todo o dinheiro que ganhara, ainda não tinha classe suficiente para a filha de lorde e lady Ashworth.
– É óbvio – disse ele, com amargura.
– Então – replicou Libby, com um nó na garganta, –também achas que devíamos ter tratado destes papéis há anos?
Rion fechou os olhos e respirou fundo. Sentia uma angústia profunda no peito. Pensara muitas vezes no regresso de Libby, mas nunca imaginara que seria daquela maneira.
Tentou controlar-se e não perder a calma. Abriu os olhos. Não ia permitir que aquela mulher lhe estragasse a vida pela segunda vez. Portanto, queria o divórcio…
Bom, ele também queria. A única razão por que não começara os trâmites fora porque estivera à espera da ocasião de poder saborear melhor a sua vingança. E tudo parecia indicar que aquele momento chegara finalmente. O destino trabalhava sempre de maneira caprichosa.
Olhou para a cara dela. Tinha as faces coradas. Talvez não quisesse continuar a ser a sua esposa, mas era evidente que continuava a desejá-lo com a mesma paixão de antes, com a mesma paixão com que ele também continuava a desejá-la, mesmo que não quisesse. Talvez pudesse proporcionar-lhe um grande prazer fazê-lo ver que era assim, dizer-lhe que ela nunca poderia deixar de o desejar, apesar da má opinião que tinha dele. Sim, seria um prazer e muito útil para a sua campanha.
Um leve sorriso apareceu nos seus lábios. Não precisava que ela tivesse uma boa opinião dele, só que estivesse ao seu lado como esposa enquanto durasse a campanha e, depois, na sua cama pela última vez. Depois, podia abandoná-la, tal como ela fizera com ele noutro tempo. Mas antes queria demonstrar-lhe que o desejo físico que sentia por ele era mais forte do que qualquer divisão de classes.
– Não, gineka mou – disse ele, curvando os lábios ao pronunciar «minha esposa» em grego. – Lamento dececionar-te, mas não estou disposto a conceder-te o divórcio.
Libby sentiu um calafrio ao ouvir o tom ameaçador da sua voz, mas tentou dominar-se. Compreendeu que ele pensava que queria tirar-lhe dinheiro através do divórcio.
– Por favor, entrega estes documentos aos teus advogados para os examinarem. Confirmar-te-ão que não estou a pedir-te nenhum tipo de compensação económica.
– Não conseguirias tirar-me nada, mesmo que quisesses.
O tom da sua voz era tão frio e cortante que Libby se sentiu como se alguém lhe tivesse posto um cubo de gelo nas costas. Aquelas palavras tão ofensivas destruíam toda a esperança de poder discutir aquele assunto de maneira amistosa.
– Surpreende-me – continuou a dizer Rion. – Se não é por dinheiro, porque queres divorciar-te de mim com tanta pressa?
– Porque é ridículo continuar por mais tempo com esta situação – respondeu ela. – Somos legalmente casados, mas nem sequer sabemos o número de telefone um do outro. Cada vez que preencho um impresso tenho de pôr uma cruz na casinha de «casada», apesar de ter passado meia década sem te ver. Parece-me uma farsa, uma mentira.
– Não foi assim noutro tempo – disse Rion, olhando para ela intensamente.
Não, pensou Libby, surpreendida por ter sido capaz de despertar muitas emoções nela com aquelas simples palavras. Não fora assim noutro tempo. Um redemoinho de imagens desconexas atravessou a sua mente: Atenas em fevereiro sob uma capa inesperada de neve a cair como se fosse uma chuva de confetes. Ela com o seu vestido de noiva e umas botas de borracha horríveis por baixo do vestido. Dois vagabundos cheios de frio que serviram de testemunhas na sua cerimónia simples de casamento na Conservatória. Aquele dia do seu casamento fora o primeiro dia autêntico da sua vida, a primeira vez que não se sentira perdida num mundo de mentiras.
– Não – admitiu ela, tentando com muita dificuldade manter o tom de voz, – mas isso foi há muito tempo. Já passaram cinco anos.
– É verdade. E, durante esses cinco anos, nunca pensaste em visitar-me, mesmo que fosse apenas para me pedir o divórcio. Porque o fizeste agora?
Libby encolheu os ombros, envergonhada. Ela também se fazia a mesma pergunta. Porque esperara tanto tempo? Esperaria que alguma coisa mudasse na sua relação? Não, ela sempre estivera convencida de que nunca poderiam reconciliar-se.
– Sempre pensei que entrarias em contacto comigo. Passei, por outro lado, a maior parte do tempo no estrangeiro, portanto quando, por razões de trabalho, tive de vir a Atenas, pareceu-me o mais lógico aproveitar a oportunidade para resolver as coisas pessoalmente e de forma amistosa.
– Achas que pode haver uma forma amistosa de te divorciares do teu marido grego? – perguntou Rion, abanando a cabeça. – Se for assim, penso que não conheces bem os homens gregos, gineka mou .
– Precisamente como grego, supus que eras um homem lógico, capaz de ver que não faz sentido prolongar mais um casamento que está morto há mais de meia década.
– Estaria de acordo se fosse verdade – replicou Rion, de forma fria e cortante. – Mas não é. Ainda me desejas. Consegui vê-lo nos teus olhos assim que entraste por aquela porta e olhaste para mim – disse Rion, dando um passo para ela. – Por muito longe que tenhas estado de mim, continuas a desejar-me, não é assim?
Libby corou intensamente.
– Mesmo que seja assim, a atração sexual não é um pilar suficiente para sustentar um casamento.
– Em todo o caso, é uma razão de mais peso do que a que me deste para te divorciares.
– Isso não é verdade. Há muitas outras razões para o divórcio ser a solução mais razoável, dada a nossa situação atual. Por exemplo, talvez… queiras casar-te com outra pessoa no futuro – disse ela, sentindo uma dor profunda ao pronunciar aquelas palavras. – Talvez eu também queira refazer a minha vida com outro homem.