Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2009 Christyne Butilier

© 2014 Harlequin Ibérica, S.A.

O homem sonhado, n.º 32 - Agosto 2014

Título original: The Cowboy’s Second Chance

Publicado originalmente por Silhouette® Books.

 

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin, Bianca e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

® e ™ são marcas registadas por Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas em que aparece ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

Imagem de portada utilizada com a permissão de Harlequin Enterprises Limited. Todos os direitos estão reservados.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-5363-8

Editor responsável: Luis Pugni

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño

www.mtcolor.es

Sumário

 

Página de título

Créditos

Sumário

Capítulo 1

Capítulo 2

Capítulo 3

Capítulo 4

Capítulo 5

Capítulo 6

Capítulo 7

Capítulo 8

Capítulo 9

Capítulo 10

Capítulo 11

Capítulo 12

Capítulo 13

Capítulo 14

Capítulo 15

Capítulo 16

Capítulo 17

Volta

Capítulo 1

 

– Maldito ladrão! – exclamou Maggie Stevens enquanto atravessava o relvado da feira, tentando não entornar a cerveja que levava nos copos de plástico. – Está a roubar-me o meu homem!

Kyle Greeley dedicou-lhe um sorriso mordaz e continuou a tirar notas de um maço que tinha nas mãos. Quando Maggie chegou ao seu lado, Kyle dera pelo menos cem dólares ao vaqueiro que tinha ao lado. O seu vaqueiro.

– O teu homem não, querida – disse-lhe Kyle. – Os teus homens.

– O que queres dizer com «homens»?

Maggie olhou para Spence Wilson, que trabalhava há alguns meses para ela. E, em seguida, viu Charlie Bain a sair de entre as sombras, com o olhar fixo nas suas botas.

Devia tê-lo imaginado.

Estava a passar um maravilhoso dia de verão em Destiny, no Wyoming, a celebrar o Quatro de Julho com a sua filha e a sua avó, mas não vira nenhum dos seus vaqueiros. Até àquele momento.

– Não é nada pessoal, menina Stevens – disse-lhe Spence. – Nós gostamos de trabalhar no Crescent Moon, mas o senhor Greeley paga muito bem.

Maggie estava furiosa. Não era a primeira vez que um pagamento mais alto tentava os seus trabalhadores do rancho, pelo menos os mais jovens e fortes.

«Tu também o fizeste no passado», recordou a si mesma.

Sim, dinheiro não era o mesmo que alguns jantares à luz das velas, mas ela também se deixara enrolar por Kyle. Até que se apercebera de que era um porco.

Kyle apoiou-se nela.

– Maggie, poderias viver comodamente se aceitasses a oferta que te fiz pela tua terra. Poderias comprar uma casa na cidade, passar mais tempo com a tua filha, arranjar um homem...

Ela olhou para a cerveja, tentou controlar a sua raiva e o impulso de lhe despejar o copo pela cabeça. Cerrou os dentes.

– Já te disse que a minha terra não está à venda.

Pelo canto do olho viu que os que tinham sido seus empregados desapareciam entre as sombras.

Covardes.

Voltou a olhar para Kyle.

– Porquê contentares-te com aqueles dois? Porque não me deixas sem ninguém e vais também atrás de Willie e de Hank?

– Esses dois velhos deveriam ter-se aposentado há anos – aproximou-se e enrolou uma madeixa do seu cabelo num dedo. – Admite-o, não consegues administrar sozinha toda aquela terra, o gado e os cavalos.

Maggie levantou o queixo e escapou dele.

– Vai para o inferno, Kyle!

Dito aquilo, dirigiu-se para onde brilhavam as luzes da plataforma situada atrás de uma alameda. Ele seguiu-a.

– Lembro-me de uma época em que não querias que me afastasse de ti.

Ela abanou a cabeça, não entendia como tinha podido ter-se deixado convencer pelos seus olhos azuis, as suas maçãs do rosto marcadas e as suas mentiras.

– Três meses – disse. – Três meses de relação comigo para conseguires a minha terra.

Ele sorriu.

– Há alturas em que um homem tem de fazer sacrifícios. Nunca entendi o que Alan vira em ti. Depois, dei-me conta de que queria o teu rancho.

Maggie virou-se para ele, furiosa.

– Pois, não o conseguiu. Nem tu vais consegui-lo.

Tinham chegado às árvores. Kyle inclinou-se e agarrou-a pelos braços. Cheirava a uísque. Maggie repreendeu-se por não se ter dado conta antes. Quando estava sóbrio, Kyle era chato, mas com alguns copos a mais, podia tornar-se mau.

– Conseguirei o que quiser – disse-lhe.

Maggie sentiu que lhe revolvia o estômago com a imagem de uma lembrança enterrada. A cerveja molhou-lhe os dedos.

– Desgraçado, tira as mãos de cima de mim neste preciso instante se não quiseres que te atire a cerveja à cara!

– Não te atreverias...

Maggie virou os pulsos com rapidez e atirou-lhe o conteúdo dos dois copos. Kyle retrocedeu e largou-a.

– Bolas!

A cerveja caiu sobre a sua camisa cara e também salpicou o vestido de alças de Maggie.

– Não me desafies! – advertiu-o, dando um passo atrás, metendo-se entre as árvores. – Afasta-te de mim.

Kyle voltou a agarrá-la, cravando-lhe as unhas nos braços.

– Vais pagar...

– Disse que a deixasse em paz.

Maggie ficou imóvel ao ouvir atrás dela uma voz grave, imponente.

Na realidade, a voz vinha de cima dela. Era a voz de um homem muito alto. Sentiu-se nervosa. O tom rouco produziu-lhe uma sensação de quê? De necessidade? De desejo?

– Não te metas onde não és chamado, Cartwright!

– A senhora já deixou os seus sentimentos muito claros.

– Eu é que vou ser claro – replicou Kyle, dando um passo em frente, mas olhando por cima da cabeça de Maggie enquanto continuava a agarrá-la. – Se quiseres manter o teu trabalho, sugiro-te que dês meia volta e desapareças.

O homem que havia atrás de Maggie deu um passo em frente.

– Largue-a – respondeu.

Kyle olhou para Maggie.

– Ainda temos coisas pendentes, tu e eu – largou-a e retrocedeu. – Não te incomodes em aparecer no Triple G esta noite, Cartwright. De facto, sugiro-te que te vás embora de Destiny. Para sempre.

E, dito aquilo, deu meia-volta e esfumou-se na escuridão.

Maggie não soube o que pensar de tudo o que acabava de acontecer. Respirou fundo e virou-se para agradecer ao seu salvador, mas tropeçou na raiz de uma árvore e perdeu o equilíbrio.

Umas mãos fortes seguraram-na pela cintura e apertaram-na contra um peito sólido e umas coxas duras como pedras. O queixo do homem roçou o seu cabelo e Maggie sentiu o fôlego quente dele na orelha.

Ela retrocedeu e levantou o olhar para lhe ver a cara. Uns olhos intensos olhavam-na de debaixo da aba de um chapéu Stetson. Uma barba escura de três dias rodeava a sua boca e cobria o seu queixo. Maggie sentiu um calafrio. Ele largou-a e retrocedeu.

– Obrigada por... – balbuciou. – Bom, obrigada.

– De nada. Está bem?

– Sim – assentiu. – Estou bem.

– É melhor que se vá embora antes que volte.

Antes que lhe desse tempo para responder, o seu salvador foi-se embora pelo mesmo caminho que Kyle. Maggie observou como desaparecia e tentou ignorar o formigueiro que tinha no estômago, e culpou Kyle Greeley pela estranha sensação. Em seguida, olhou para o que restava de cerveja. Racy e Leeann estavam à espera dela. Seria melhor que se fosse embora. Com o cuidado de não voltar a tropeçar nas raízes das árvores, dirigiu-se para a pista de dança.

Maggie cumprimentou várias pessoas antes de ver a sua melhor amiga a dançar com o seu trabalhador de setenta anos. Willie estava a esforçar-se para acompanhar Racy, que tinha menos quatro décadas do que ele, mas, tal como acontecia a toda a gente, distraía-se com os caracóis avermelhados e as curvas dela.

A música acabou e Racy dirigiu-se para Maggie.

– Ena, Willie ainda sabe dançar! – pegou num dos copos. – Já era hora. Onde te tinhas metido? E o que aconteceu à minha cerveja?

Maggie deitou o que restava no seu copo no de Racy.

– Distraí-me.

– A fazer o quê?

Ela ignorou a pergunta. Não queria que Kyle lhe estragasse a festa.

– Onde está Leeann? Pensei que ia ficar connosco.

– O bipe dela tocou há dez minutos.

– Pensava que Gage lhe dera a noite livre.

– Sim, mas ser ajudante de xerife numa cidade pequena significa estar sempre disponível. Além disso, já conheces o xerife Steele – Racy soprou. – E onde estão a tua avó e Anna?

– A minha avó foi para o rancho e Anna, vai dormir na casa de uma amiga.

A Racy iluminou-se-lhe o rosto com um sorriso.

– Portanto, estás sozinha esta noite. Querida, vamos procurar alguém com quem dançar.

Maggie pensou numas calças de ganga, uma pele morena e um chapéu. Apesar da escuridão, recordava que o seu salvador tinha os ombros largos, que usava a camisa arregaçada e que as calças de ganga se colavam às pernas compridas.

Tentou não pensar mais nele e concentrar-se na sua amiga.

– Nunca te vais fartar? Já te disse que não me interessa. Além disso, já tenho muitas coisas na cabeça. Especialmente agora. Greeley tirou-me Spence e Charlie esta noite.

– Que víboras rasteiras! Eu pensava que iam ficar. O que vais fazer?

O que ia fazer? Necessitava de ajuda. Com um pouco de sorte, os anúncios que pusera por toda a cidade levar-lhe-iam algum rosto novo.

– O mesmo de sempre – respondeu, – seguir em frente.

– Bom, esta noite, não. Esta noite é para te divertires e precisas de um vaqueiro atraente que te deixe demasiado dorida para te mexeres e demasiado cansada para que te importe.

– O que preciso é de ir para casa. Tenho um monte de papelada à minha espera e...

– Vá lá! Estamos de férias! – Racy acabou a cerveja e deitou o copo num cesto de lixo próximo. – Estamos a celebrar a independência do nosso país, para não falar da nossa. Além disso, isto está cheio de vaqueiros bonitos.

– Esquece, não me interessa.

– Olha, vou ver se encontro um par de dança e tu devias fazer o mesmo. E, depois, outro e outro – piscou-lhe o olho. – Eu vou ver se chego aos dez.

Maggie observou como Racy agarrava o vaqueiro que tinha mais perto e o levava para a pista de dança.

– Quanto tempo se demora a chegar a zero? – murmurou.

 

 

Zero.

Essas eram as suas hipóteses de voltar a arranjar trabalho naquela cidade perdida no mapa chamada Destiny. Era um bom lugar para um vaqueiro sem sorte como ele.

Landon atravessou a feira, que estava a abarrotar. O sol já se pusera e grupos de adolescentes e famílias divertiam-se nas barracas de jogos e nas atrações que giravam com néones.

Passou ao lado de uma menina que ia entusiasmada com um peluche e ficou sem ar. Enfiou a mão no bolso e tocou num objeto ovalado que conhecia muito bem. As suas botas deixaram de se mexer e fechou os olhos para bloquear uma lembrança capaz de o fazer cair de joelhos.

Demorou um pouco, mas conseguiu-o. Respirou fundo, abriu os olhos e viu o xerife a conversar com um grupo de homens. Puxou o chapéu até aos sobrolhos. Se tinha aprendido alguma coisa durante os últimos meses fora a evitar os agentes da lei.

Sentiu fome ao passar pelas bancas de comida, mas ignorou o cheiro a cachorros-quentes e a caramelo. Os cinquenta dólares que tinha no bolso teriam de lhe durar até que voltasse a ter trabalho. Depois de ter defendido aquela mulher, não arranjaria outro a menos de trezentos quilómetros dali.

Mas que mulher!

Tinha o cabelo cor de mel e cheirava a doce e a limpo. Apesar de usar um vestido largo, tinha podido verificar ao agarrá-la que tinha curvas. Não tinha pretendido aproximar-se tanto, mas ainda recordava o peso do seu corpo e a carícia do seu cabelo contra a barba.

Quando o olhara, vira nos seus olhos um brilho de algo... Desejo, talvez. Apesar da raiva e do medo. E isso disparara-lhe um alarme na cabeça.

«Vai-te embora! Já!»

Tinha ignorado o seu próprio conselho tempo suficiente para se assegurar de que a mulher estava bem e, em seguida, tinha seguido o seu ex-chefe para se assegurar de que o cretino não voltava.

Mas necessitava de trabalho.

O rancho de Greeley era o maior da zona. E ele falara a sério quando lhe dissera que se fosse embora da cidade. Os ranchos grandes e os seus donos tinham muito peso nas comunidades pequenas.

Landon dirigiu-se para o fundo do estacionamento, onde tinha o todo-o-terreno e o reboque para o cavalo. A escuridão e uma relativa tranquilidade eram o máximo que podia oferecer ao seu melhor amigo naquele momento. G. W. era o seu único amigo e o principal motivo pelo qual saíra da autoestrada algumas horas antes naquele dia.

– Eh, rapaz... – disse, entrando no reboque e aproximando-se do cavalo. – Como está essa pata?

Ajoelhou-se e murmurou suavemente enquanto passava a mão pela pata de G. W., tocando na zona enfaixada. O cavalo soprou suavemente e afastou-se.

– Sei que odeias estas coisas, mas ajudará a diminuir o inchaço.

Ainda não o fizera.

Landon apercebera-se de que o cavalo não se apoiava naquela pata na mesma noite em que lhe tinham dito, de maneira pouco educada, que se fosse embora do seu último trabalho. Tinha passado os últimos sete dias na estrada e isso não tinha ajudado nada a curar a ferida. Precisava de encontrar um lugar onde os dois pudessem dormir bem para poder cuidar de G. W.

Tinha arranjado três trabalhos desde que estava em liberdade. E tinham-no mandado embora dos três.

Da primeira vez, fora ingénuo ao falar abertamente da sua prisão. Não voltaria a fazê-lo. A partir de então, fizera o possível para não falar do assunto, mas o assunto acabava sempre por surgir.

Voltou a rugir-lhe o estômago. Abriu a geleira que havia num canto e encontrou-a vazia. Os sacos de gelo já estavam a derreter-se.

Apoiou a cabeça no cavalo.

– Vou buscar alguma coisa para comer e mais gelo. Volto já.

Acariciou G. W., saiu e fechou o reboque, dirigindo-se para o minimercado que havia do outro lado da rua. Ao entrar, as luzes fluorescentes iluminaram uma mulher atrás do balcão.

Tinha-o olhado com receio?

Dedicou-lhe uma saudação rápida com a cabeça e dirigiu-se para o primeiro corredor. Cinco minutos mais tarde, voltou para a caixa e um anúncio afixado num painel informativo chamou a sua atenção: «Procuram-se vaqueiros».

Arrancou o papel e meteu-o no bolso. Depois de pagar, voltou a atravessar a estrada com uma sandes, um refresco e um saco de gelo. Rasgou o plástico que envolvia a sandes com os dentes. O pão estava duro, mas esperou que lhe tirasse o mau sabor na boca que lhe deixara o olhar da empregada.

Tinha o cabelo demasiado comprido e há uma semana que não se barbeava. Talvez fosse por isso. Ou talvez porque era um estranho numa cidade pequena. A empregada tinha sorrido de orelha a orelha a dois vaqueiros bem vestidos que tinham entrado atrás dele, devia conhecê-los.

Esqueceu o assunto e acabou a sandes em duas dentadas. Não costumava pensar demasiado. Pelo menos, não desde que o tinham posto em liberdade. Antes, tivera muito tempo para pensar. Naquele momento, preferia um dia de trabalho árduo que o deixasse apenas com forças para dormir. Algo que não fizera muito durante a última semana.

Foi até ao reboque e tirou G. W., tirou-lhe a ligadura e pôs-lhe gelo no ferimento. Pôs-se sob a luz de um candeeiro, abriu o refresco e bebeu um gole. Em seguida, tirou o papel do bolso das calças de ganga e voltou a lê-lo.

– Muito bem, Crescent Moon, és a minha última oportunidade.

Teve uma sensação estranha de repente, sentiu dor entre as omoplatas. Segundos mais tarde, chocava com a cabeça contra o reboque.

 

 

Maggie despediu-se de Racy fora da pista de dança. Ela franziu o sobrolho, mas não lhe fez caso e abriu caminho entre a multidão. Como não encontrou Willie, decidiu ir para casa sozinha.

Também não ia continuar à procura do seu vaqueiro salvador.

– Não, não é o meu vaqueiro – murmurou, tirando as chaves da mala.

Sentiu-se culpada. Tinha ouvido Kyle a dizer-lhe que não voltasse para o rancho. Odiava a ideia de que estivesse sem trabalho por sua causa.

Enquanto esperava na beira da pista de dança, tinha-lhe ocorrido oferecer-lhe trabalho. Necessitava de um homem, de vários, de todos os que pudesse permitir-se.

Recordou o que Kyle lhe dissera, que comprasse uma casa na cidade, passasse mais tempo com a sua filha e arranjasse um homem.

Não. Não aquele tipo de homem. Não tinha tempo, forças, nem a energia emocional necessária para isso. Já não.

Enquanto atravessava o estacionamento, olhou para o relógio. Eram quase dez. Como a sua filha não estava em casa e a sua avó devia estar a ler na cama, teria tempo de sobra para atacar o caos que havia na sua secretária.

Era justamente o que mais lhe apetecia fazer numa noite de verão...

O que teria adorado fazer era tomar um longo banho nas águas frescas do lago que havia atrás da casa.

Sem fato de banho. E, se possível, acompanhada.

A imagem de um certo vaqueiro voltou à sua mente. Naquela ocasião, Maggie deixou-se levar pela fantasia, sorriu.

– Está bem, admite-o, talvez Racy tenha razão. Talvez há muito tempo...

O relinchar forte de um cavalo sobressaltou-a. Ficou imóvel, acelerou-lhe o coração.

Ouviu o animal pela segunda vez e soube que estava apavorado. O som vinha do fundo da fila de carros. Correu para lá e viu um cavalo cor de mel atado a um reboque, em pânico. Mexia-se freneticamente, tentando libertar-se. Ia acalmá-lo, mas parou ao ver três homens a lutar muito perto dali.

Na realidade, eram dois valentões a dar uma surra ao terceiro, mas este também se defendia, apesar de o segurarem pelos dois braços. Um punho golpeou o seu rosto e o homem inclinou-se para diante.

– Parem! – gritou Maggie. – Deixem-no em paz!

Os dois valentões olharam-na, respiravam com dificuldade. Os chapéus ensombreciam-lhes o rosto. Largaram o homem e desapareceram na escuridão. O homem caiu ao chão.

Maggie correu até onde estava caído.

– Está bem?

Ele gemeu e apoiou as suas mãos enormes no chão. Os músculos dos seus ombros esticaram-se sob a camisa ao tentar levantar-se.

– Que pergunta tão tonta... É óbvio que não está bem. Não se mexa, vou pedir ajuda.

– Não – respondeu ele em voz baixa, com determinação.

Maggie ajoelhou-se. Agarrou-lhe o braço para o ajudar a levantar-se. Os seus dedos eram muito pequenos em comparação com aquele bíceps. Notou que o corpo dele desprendia muito calor.

– Está ferido. Por favor, deixe-me...

– Não – repetiu ele. – É a última coisa de que preciso.

O vaqueiro deu meia-volta e ficou de costas. Gemeu e praguejou. Tinha o cabelo escuro sobre a testa e um fio de sangue no canto da boca.

Maggie procurou um lenço na sua mala.

– Olhe, não sei porque discutiu com os seus amigos...

– Não são meus amigos – murmurou ele.

– Nesse caso, temos de chamar o xerife.

Aproximou-se mais para lhe limpar a ferida da boca com o lenço e os seus dedos roçaram-lhe o queixo. Recordou o cheiro dos rolos de feno que havia no estábulo no verão.

– Roubaram-lhe alguma coisa?

– Não. Fiz uma boa ação e deram-me uma surra por isso – disse com os dentes apertados, enquanto se apoiava num cotovelo. – Não podia falhar. Fazes o correto e...

Deixou de falar ao virar-se para ela para lhe afastar a mão. Os seus olhos pretos, um deles inchado, encontraram-se com os dela. Então, agarrou-a com força pelo pulso.

– Você.

Capítulo 2

 

– Você! – repetiu Maggie, com o coração quase na boca.

Escapou dele, que agarrou o lenço e o apertou contra a boca. Tinha a camisa aberta até à cintura, estava coberto de pó e salpicado de sangue. Ao seu lado havia um chapéu Stetson preto.

– Oh, meu Deus, não foi... – não tinha reconhecido os outros dois homens na escuridão, mas eram... homens de Greeley. – Bateram-lhe por minha causa.

– Não – respondeu ele, desviando o olhar e limpando o sangue.

– Não acredito.

Ele dobrou uma perna e abanou a cabeça.

– É-me indiferente no que acredite – replicou, levantando-se de modo inseguro. – Onde está o meu chapéu?

Maggie levantou-se e preparou-se para o agarrar se fosse preciso. Recolheu o Stetson e estendeu-lho.

– Bateram-lhe porque me ajudou.

– Esqueça isso, senhora.

Agarrou o chapéu, pô-lo e fez uma careta. O cavalo gemeu. O homem balançou, mas conseguiu manter o equilíbrio enquanto acalmava o animal.

– Calma, rapaz... Está tudo bem.

Maggie pegou na sua mala e seguiu-o.

– Fizeram mal ao seu cavalo?

– G. W. está bem. Vá-se embora.

Aquelas palavras doeram-lhe, mas Maggie não se rendeu.

– Talvez o cavalo esteja bem, mas você não está. Devíamos pedir ajuda...

Maggie deixou de falar e observou como desatava o cavalo e o levava para dentro do reboque. Apoiou-se na superfície de metal e meteu uma madeixa de cabelo atrás da orelha. O aroma a feno invadiu-a.

Sentiu pena do cavalo, que devia ter-se assustado muito. Dentro do reboque, o vaqueiro tranquilizava-o falando em voz baixa. Também estava a tranquilizá-la a ela. A pouco e pouco, as suas palavras deixaram de se ouvir. Maggie apertou a orelha contra o reboque. Nada.

Estaria bem? Por acaso, tinham-lhe batido tanto que desmaiara?

– Bolas, Kyle... – sussurrou. – Por acaso, ainda não chega?

– Ainda está aí?

Maggie deu meia-volta e viu o homem atrás dela, tão perto que a aba do seu chapéu lhe roçava o cabelo. Era tão alto que tapava a luz do candeeiro que brilhava por cima deles. A sua presença afligia-a, mas, ao mesmo tempo, fazia-a sentir-se segura.

Segura? De onde tinha saído aquilo?

– A clínica fica ao fundo da rua – disse-lhe. – Devia ir lá para que lhe dessem uma olhadela às feridas.

Ele bebeu um gole de uma garrafa, fez uma careta e cuspiu a água manchada de sangue. Em seguida, deitou água na mão, lavou a cara e secou-a com a manga da camisa.

– Porquê?

Maggie apoiou as mãos nas ancas.

– Olhe, porque precisa...

– Não preciso de...

Voltou a cambalear. Maggie apoiou uma mão no seu peito para evitar que caísse sobre ela.

– Não posso ir-me embora enquanto não souber que está bem.

Ele baixou o olhar até à sua mão e, em seguida, voltou a subi-lo até à sua cara.

– Estamos bem.

Maggie afastou a mão do seu peito quente.

– Os seus lábios deixaram de sangrar, mas tem um olho muito inchado e um hematoma muito feio na testa.

– Estamos a brincar aos médicos?

As suas palavras fizeram com que se ruborizasse. Maggie engoliu em seco.

– Vou chamar uma ambulância.

– Não, obrigado – respondeu ele, indo para o banco do condutor.

Ela seguiu-o.

– Não devia conduzir. Poderia desmaiar e você e o seu cavalo poderiam morrer.

Ele tentou abrir a porta, mas praguejou ao não o conseguir à primeira. Voltou a tentá-lo e entrou no veículo.

– Já me bateram antes, não estou gravemente ferido e, de qualquer modo, não irei para longe.

Maggie pôs a mão na porta para que não a fechasse. Viu como ele tentava ligar o carro.

Tentou-o duas vezes e, em seguida, voltou-se olhando-a nos olhos.

– Tinha pensado em procurar... um lugar onde dormir.

O facto de falar em voz baixa e de ter um sotaque sulista fez com que Maggie sentisse calor num lugar que acreditava morto há muito tempo.