
Editado por Harlequin Ibérica.
Uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.
Núñez de Balboa, 56
28001 Madrid
© 2005 Chris Marie Green
© 2016 Harlequin Ibérica, uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.
Arrisca-te na paixão, n.º 2153 - dezembro 2016
Título original: Her Gypsy Prince
Publicado originalmente por Silhouette® Books
Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial.
Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.
Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.
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Imagem de portada utilizada com a permissão de Harlequin Enterprises Limited.
Todos os direitos estão reservados.
I.S.B.N.: 978-84-687-9170-8
Conversão ebook: MT Color & Diseño, S.L.
Página de título
Créditos
Sumário
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Epílogo
Se gostou deste livro…
«Moral, decência, contra a criminalidade!» Elizabeth Dupres resmungou a ordem do Comité para a Decência e a Moralidade, com a boca cheia do pó texano. Enquanto andava, descrevendo círculos, juntamente com os seus companheiros de manifestação, a sua mente vagueava a milhares de quilómetros de distância da feira de Blossom County. Com uma mão, compôs a aba do chapéu, de maneira a que a protegesse do sol abrasador que brilhava naquela manhã de finais de Junho. Com a outra, agarrou no seu cartaz, onde se lia: Amamos as nossas crianças. Esta declaração simples contrastava com o resto dos slogans: Abaixo os vigaristas! Os feirantes são as sanguessugas da sociedade ou Expulsem os ciganos criminosos!
Elizabeth perguntou-se o que fazia ela entre aquela gente. Depois de contornar uma esquina próxima da grade da entrada da feira, separou-se do grupo e dirigiu-se a uma arca que o comité mantinha cheia de bebidas frescas. Precisava de tirar o gosto que aquela manifestação estava a deixar-lhe na boca. Desde o início da feira, os ânimos tinham estado a aquecer a pouco e pouco. As ordens tinham-se tornando cada vez mais desagradáveis, mais insultuosas. Suspirando, dirigiu o seu olhar para a feira. Atrás da grade via-se um mundo diferente, vistoso e cheio de cor, de diversões de aço e tendas listadas. Ao longe, via-se o espectro imponente da Casa do Horror e, entre tudo aquilo, reinava, silenciosa e majestosamente, a Roda Gigante. Um homem com umas calças de ganga gastas e botas de trabalho, mas sem camisa, começou a subir por ela para levar a cabo uma inspecção de segurança. A sua pele bronzeada brilhava sob o sol e deixava adivinhar cada um dos seus músculos e tendões. O seu cabelo, preto e apanhado num rabo-de-cavalo, soltava-se cada vez que fazia um movimento brusco. Elizabeth já o vira por ali, mas não reparara bem na sua cara. Intrigada, observou-o com atenção, enquanto estendia uma mão distraída para a arca e tirava uma garrafa de refrigerante. Era demasiado cedo para beber bebidas açucaradas, mas abriu-a de qualquer forma, deu um gole e apoiou a garrafa gelada contra o seu rosto, com a vaga esperança de que aquele gesto lhe servisse para se esconder dos seus companheiros.
«Hum, que homem tão apetecível!», pensou, com o coração acelerado, enquanto o via impulsionar-se com aqueles braços poderosos. «Se pudesse…!»
Elizabeth sentiu-se observada e desviou o olhar do homem para o dirigir para a sua mãe, Bitsy Dupres, a presidente do Comité para a Moralidade e a Decência. Apesar do calor intenso da manhã, o seu aspecto era fresco e impecável. Tinha o cabelo loiro apanhado num coque elegante e a sua figura esbelta enfatizada por um fato de linho e um colar de pérolas.
Elizabeth dedicou-lhe o seu melhor sorriso.
– Estou a descansar um pouco, mamã.
Desejou poder fazê-lo o resto do ano. Ou, pelo menos, durante as duas últimas semanas das festas. A sua mãe sorriu-lhe com carinho, antes de voltar para o seu trabalho voluntário como guardiã espiritual de Blossom, no Texas. Liderava a manifestação com a habilidade de um maestro.
«Feirantes, escória, levem essa roda!» Que agradável!
Elizabeth estava ali sobretudo pela sua mãe. Era verdade que ela desejava o melhor para os vizinhos de Blossom, especialmente para as crianças. Ser professora do ensino básico fazia-a sentir-se especialmente protectora. Entendia porque a sua mãe e os outros membros da comunidade desejavam proteger a cidade do perigo que significavam os forasteiros. Mas gostaria que mostrassem um pouco mais de clemência; não havia nenhuma necessidade de lhes chamarem «escória», pelo amor de Deus!
Um dos manifestantes abandonou o grupo e aproximou-se dela. Tratava-se de Spencer Cahill, o filho do dono da geladaria Dairy Dream. Era o típico rapaz loiro de olhos azuis, com o qual qualquer mãe sonharia casar a sua filha.
– Dás-me um refrigerante? – pediu-lhe, com as faces coradas.
Elizabeth sentiu vontade de lhe responder que podia servir-se ele mesmo, que era para isso que tinha duas bonitas mãos. A expressão do seu rosto denunciou os seus pensamentos.
– As manifestações põem-te de mau humor, Bets – Spencer riu-se.
– Ninguém me chamava assim desde que saí da escola. Qualquer mulher que tenha vinte e três anos merece um diminutivo mais digno.
Entre outras coisas, «Bets» parecia-se demasiado a «Bitsy» e Elizabeth não era uma cópia da sua mãe, por mais que as pessoas quisessem acreditar nisso. Embora se amassem e fossem loiras com olhos azuis, a verdade é que eram muito diferentes. Pelo menos, era o que Elizabeth achava.
– Além disso, não estou de mau humor. O que se passa é que não sei porque estamos aqui.
– Porque os feirantes causam problemas.
– Quem causa mais problemas? – perguntou ela, olhando em direcção à roda. – Os feirantes ou os respeitáveis cidadãos de Blossom? Dá-me a sensação de que estamos a armar mais confusão do que eles.
Spencer não pareceu achar muita graça ao comentário.
– Vês? É exactamente o que o comité receava. Quando os feirantes vieram para a cidade há dois anos, fizeram uma lavagem cerebral às pessoas, como agora. Só que então aconteceu a «Fraude».
«Ah, claro, a Fraude!», pensou Elizabeth, enquanto passeava o seu olhar pelo feirante musculado.
Tudo começara quando, numa feira anterior, uma cigana previra que alguns dos habitantes da cidade iriam tornar-se ricos muito em breve. Pouco depois, quando os feirantes tinham partido, chegara a Blossom um negociante a vender acções imobiliárias. Muitos daqueles que tinham ouvido falar da sorte da adivinha tinham mordido o isco… e perdido muitíssimo dinheiro, já que as acções eram falsas. Elizabeth conhecia bem a história, visto que o seu pai fora uma das vítimas. Quisera pagar a escola da sua filha de repente e garantir o futuro de toda a família. Não estavam mal a nível económico, mas, para Carlton Dupres, o mais importante na vida era tornar a sua esposa feliz. A verdade era que Bitsy nunca lhe pedira muito, mas ele delapidara as suas economias de qualquer forma. Antes de Carlton morrer, o comité organizador das festas decidira proibir que, no futuro, a feira fizesse parte das festividades da cidade. Isso fora desastroso do ponto de vista económico e a cidade voltara a sofrer as consequências.
Durante a época da proibição, Bitsy organizara o Comité para a Decência e a Moralidade, o CDM. Tratava-se de um grupo que liderava a luta contra os indesejáveis, como aquele que tinham organizado a Fraude.
– Spencer, aprendemos a nossa lição. Já não há razão alguma para reagirmos assim. Os feirantes estiveram aqui o mês inteiro e não vamos expulsá-los.
– E o que me dizes dos actos de vandalismo que têm estado a acontecer desde que chegaram à cidade?
Era verdade que alguns membros do Comité tinham denunciado o roubo de alguns enfeites de jardim, mas parecia que os culpados eram uns adolescentes aborrecidos e não os feirantes. Mais preocupantes eram os rumores de sabotagem dentro da própria feira, algo que não parecia ter uma explicação assim tão simples. Mas, em vez de discutir, Elizabeth pousou a garrafa, ainda meio cheia, sobre a mesa de recolha de assinaturas e dirigiu-se para a grade. Enquanto se abanava com a aba do seu chapéu, voltou a fixar a vista na roda. O homem sem camisa chegara praticamente ao cimo da roda e tentava manter o equilíbrio, agarrando-se com uma só mão. Elizabeth susteve a respiração. Que tipo de louco era aquele? O homem avançou para o compartimento seguinte para continuar a sua inspecção de segurança. Com o cabelo a sair-lhe do rabo-de-cavalo, parecia um daqueles aventureiros dos romances, de capa e espada. Elizabeth sentiu que o sangue lhe pulsava com força nas veias. Por mais que tentasse, não conseguia parar de o observar. Quando os seus olhares se cruzaram, ele também não desviou a vista. O tempo pareceu ter parado. Estaria a acontecer-lhe aquilo que lera nos seus antigos livros? Seria aquele um daqueles momentos que só acontecem nos filmes e nas mentes dos loucos e dos sonhadores? Surpresa, excitação e até terror… Era o que estava a sentir naquele momento. Nem sequer era capaz de lhe sorrir, não conseguia fazer mais do que admirar, boquiaberta, a sua beleza selvagem. Ele levou, lentamente, a mão à testa e fez-lhe uma saudação militar desenvolta, enquanto o seu sorriso se adoçava.
A animação devolveu-a à realidade. «Feirantes, escória, levem essa roda!» Elizabeth pestanejou e, desviando o seu olhar do rapaz, fixou-se nos membros do comité. Parecia que o CDM duplicara os seus esforços. Acabava de chegar um camião cheio de voluntários, dispostos a substituírem os que ali estavam. Suspirou, aliviada. Tornar-se amiga de um feirante não era algo próprio de uma rapariga como ela. Uma Dupres, um membro respeitável da comunidade. Cassie e Fred Twain, os sócios e amigos mais incondicionais da sua mãe, caminhavam para os piquetes. Estavam acompanhados dos seus dois filhos, que corriam alguns metros à frente, em direcção a Bitsy, que, com frequência, fazia de ama dos meninos. Cassie era agente imobiliária e advogada, uma mulher de aspecto insignificante, de cabeleira curta e vestida com roupas passadas de moda. Fred, um homem de olhos aquosos e cabelo branco prematuro, tinha a expressão resignada que lhe era habitual. Banqueiro no Strong Bank and Trust, assumia o papel de marido trabalhador, subjugado pela sua esposa. Bitsy pegou nos meninos ao colo, muito contente, como sempre, de os ver. Elizabeth alegrava-se sempre de voltar a ver os seus antigos pupilos, mas teve de reconhecer que aquele não era o lugar apropriado para os gémeos Twain.
– Mamã…!
– Sei o que estás a pensar, Elizabeth. Mas Cassie e Fred são os líderes do próximo turno.
– Cassie e Fred estão a expor os meninos a uma situação muito desagradável, na qual eu também estou envolvida para meu pesar. Se te disser a verdade, isto não é o que eu entendo por umas férias relaxantes.
Bitsy suspirou. Aquele assunto fora motivo de discussão em inúmeras ocasiões.
– Bom, eu cuido de Abe e Abby. Vou levá-los agora mesmo a casa. Espero que isto te faça sentir melhor.
– Sim, faz-me sentir melhor.
Odiava discutir com ela. Quando isso acontecia, sentia-se desleal. A sua mãe tinha sempre aquela expressão de tristeza nos olhos, que recordava a Elizabeth o que acontecera ao seu pai. A Fraude. Os descarados. Como as pessoas de bem tinham de lutar para devolverem a segurança aos seus lares.
Sabendo que rumo tomaria a conversa, Elizabeth declarou:
– O CDM já fez o que tinha a fazer. Porque não nos concentramos em algo que valha a pena como, por exemplo, ajudar aquelas pobres pessoas do condado próximo, que perderam as suas casas por causa do tornado? Já passaram dois dias e continuam a precisar de ajuda.
– Ajudámo-los, proporcionando-lhes comida e alojamento – interveio a sua mãe, com voz tranquila. – Acho que devias mudar de atitude.
Já estavam a discutir outra vez. Os olhos de Bitsy começaram a encher-se de lágrimas. Apesar de ter passado um ano e meio desde que perdera o seu marido, tinha a dor muito recente. E Bitsy Dupres estava a lutar contra o «mal», o mesmo que matara o seu pobre Carlton. Frustrada por se ver no meio daquela conversa, Elizabeth não conseguiu evitar dar uma olhadela rápida à roda. O homem tinha desaparecido.
Numa tentativa de acalmar os ânimos, Elizabeth dirigiu-se para a grade, para acabar o seu refrigerante em paz. Queria esquecer a situação, a sua própria dor por ter perdido o seu pai sendo ela tão nova, a causa a que a sua mãe se entregara e que estava a descontrolar-se.
– Elizabeth!
Era a voz da sua Bitsy. Surpreendida, parou de repente. O chiar de uns travões devolveu-a à realidade. Ficou envolta numa nuvem de pó, depois da qual pôde ver um camião cheio de artigos de feira. Do banco do condutor saiu disparado na direcção dela um feirante rechonchudo, com a roupa coberta de óleo e um chapéu de vaqueiro.
– Está bem?
Ignorando o facto de que lhe parecera sofrer um ataque de coração, pareceu-lhe que estava tudo em ordem.
– Sim, eu…
– No que estava a pensar, para se interpor no meu caminho daquela maneira? Podia tê-la…
Spencer Cahill, que voltara para o piquete depois da sua conversa com Elizabeth, avançou para o homem.
– Vá-se embora!
O feirante, embora muito mais baixo do que Spencer, encarou-o.
– E quem és tu para me dizeres que me vá embora, engraçadinho?
Ai, «engraçadinho» era um nome a que Spencer não iria achar muita graça! Elizabeth avançou para se pôr entre os dois homens.
– Ouçam-me, ninguém ficou ferido! Spencer, deixa-o passar com o seu camião.
Elizabeth sentiu-se envergonhada. Sabia que Spencer era apaixonado por ela desde o liceu, mas, para além de o acompanhar como amiga a uma festa de fim de curso, sempre lhe deixara claro que a sua relação seria sempre platónica. Faltava algo. Faísca. O que sentira ao olhar para o homem da roda.
– Menina – o feirante tirou o chapéu como sinal de cortesia. – Agradeço-lhe a sua ajuda, mas não estou disposto a que este menino da cidade me diga o que tenho de fazer.
– Menino? – gritou Spencer, vermelho de raiva. – Quem é menino?
Estavam a aproximar-se novamente, em atitude ameaçadora. Nenhum dos dois estava disposto a ceder.
De repente, uma voz profunda, procedente do outro lado da grade, ordenou:
– Hudson, anda cá!
O homem da roda, já com camisa, estava a abrir lentamente a grade. A multidão, calada, cravou os seus olhos no desconhecido. Elizabeth sentiu que um formigueiro lhe percorria o corpo todo. A proximidade permitiu-lhe observá-lo com atenção: era muito alto, tinha a pele morena, um cabelo escuro que lhe chegava à altura dos ombros e uns olhos azuis penetrantes que estavam cravados nela.
Elizabeth engoliu em seco, enquanto tentava recuperar o fôlego e o equilíbrio. Incapaz de lhe sustentar o olhar, fixou-se no seu rosto, sulcado por uma longa cicatriz que se estendia da maçã do rosto ao queixo. Um cigano. O espio de algo proibido, para além dos limites da sua existência protegida e aborrecida. Se tivesse a coragem de lhe devolver o olhar… Um olhar faminto pousou sobre ela e não sobre Spencer. Este avançou para o homem da roda com ar ameaçador.
– Em Blossom, não gostamos que olhem assim para as nossas mulheres! – avisou.
– Deixa estar, Spencer! – interveio Elizabeth, fracamente.
– Quando repararmos, estes indesejáveis estarão a passear-se pelas nossas ruas, a assustarem mulheres como tu.
– Faz o favor de sair das cavernas e deixa-os passar!
Naquela altura, o que Elizabeth queria era afastar Spencer dela própria. Mas o homenzinho adiantou-se.
– Tu não falas assim com ela, engraçadinho! – gritou, enquanto lhe dava um bom empurrão.