A HISTÓRIA DO OUTRO SÁBIO


Aquele que, para salvar sua alma, procura pelo paraíso sozinho,

Não alcançará seu objetivo, mesmo estando no caminho;

No entanto, quem perambula ao longe, mas com amor,

Será ainda levado ao lugar dos abençoados, pelo Senhor.


Você já conhece a história dos Três Reis Sábios do Oriente e como eles viajaram de muito longe para oferecer seus presentes na manjedoura, em Belém. Mas você alguma vez já ouviu a história do Outro Sábio, que também viu a estrela no céu e passou a segui-la, mas não conseguiu chegar junto dos seus companheiros à presença do menino Jesus?

Do grande desejo deste quarto peregrino e como isso lhe foi negado – e mesmo assim alcançado? Das suas muitas andanças e provações da alma; do longo caminho de sua busca e da maneira estranha como ele encontrou aquele que procurava?

Eu contarei a história por meio dos fragmentos que ouvi no Salão dos Sonhos, no Palácio do Coração do Homem.

NO CAMINHO ESCONDIDO DA TRISTEZA


Então, novamente um silêncio tomou conta do Salão dos Sonhos, mais profundo e mais misterioso do que o primeiro intervalo, e eu entendi que os anos de Artaban estavam fluindo muito rapidamente sob o silêncio de um pegajoso nevoeiro; consegui enxergar só de relance, aqui e lá, o rio da sua vida brilhando   através das sombras que escondiam seu curso. 

            Eu o vi movendo-se entre a multidão de homens no populoso Egito, procurando em todos os lugares em busca de pistas sobre a família vinda de Belém. Encontrou vestígios sob as grandiosas árvores plátanos de Heliópolis e junto às muralhas da fortaleza romana da Nova Babilônia ao lado do Nilo – vestígios tão fracos e ralos que desapareciam continuamente, como pegadas na areia da beira do rio, que são afixadas por um momento de umidade e, instantes depois, desaparecem. 

            Eu o vi novamente aos pés das pirâmides, que elevavam seus picos afiados até o intenso brilho de açafrão do pôr do sol, monumentos imutáveis ​​da glória perecível e da esperança imperecível do homem. Ele olhou para a grande face da esfinge agachada e tentou em vão entender o significado dos seus olhos calmos e boca sorridente. Era, de fato, a zombaria de todo o esforço e aspiração, assim como Tigranes dissera – a brincadeira cruel de um enigma que não tem resposta, uma busca sem fim? Ou haveria, afinal, um toque de compaixão e encorajamento naquele inescrutável sorriso – uma promessa de que até mesmo um derrotado pode alcançar  a vitória, de que um enganado pode descobrir o prêmio, de que o ignorante pode se tornar sábio, de que o cego pode um dia enxergar, e de que o errante pode ainda encontrar o paraíso? 

            Eu o vi de novo em uma casa obscura de Alexandria, tomando conselhos com um rabino hebraico. O homem venerável, curvando-se sobre os rolos de pergaminho em que as profecias de Israel foram escritas, lia em voz alta as palavras patéticas que predisseram os sofrimentos do Messias – o prometido, o desprezado, o mais rejeitado entre os homens, o homem das aflições e da familiaridade com o sofrimento. 

            "E lembre-se, meu filho", disse ele, com os olhos fixos na face de Artaban, "o Rei que você está buscando não é para ser encontrado em um palácio, nem entre os ricos e poderosos. Se a luz do mundo e a glória de Israel tivessem sido nomeadas para vir à Terra através da grandeza e o esplendor terreno, já deveriam ter aparecido há muito tempo. Por isso nenhum filho de Abraão jamais voltará a disputar o poder que José tinha nos palácios do Egito, ou a magnificência de Salomão entronizado entre os leões em Jerusalém. A luz que o mundo está esperando é uma nova luz, é a glória que se elevará paciente e triunfante sobre o sofrimento. E o reino que deve ser estabelecido para sempre é um novo reino, a realeza do amor perfeito e invencível. Eu não sei como isso acontecerá, nem como os turbulentos reis e povos da Terra serão levados a reconhecer e homenagear o Messias. Mas isso eu sei. Aqueles que procuram por ele serão bem-sucedidos se o procurarem entre os pobres e os humildes, entre os tristes e os oprimidos ". 

           

            Parecia que ele havia quase esquecido da sua busca. Mas o vi por um momento enquanto contemplava sozinho o nascer do sol, esperando no portão de uma prisão romana. Ele havia tirado a pérola, a última de suas joias, de um lugar secreto perto do peito dentro de sua roupa. Ela continha um brilho moderado, uma suave e iridescente luz, cheia de cores mutantes de azul e rosa, e ao olhar para ela, ele estremeceu. A pérola parecia ter absorvido alguns dos reflexos das cores da safira e do rubi que tinham sido perdidos. E assim, o profundo e secreto propósito de uma vida nobre atrai para si as memórias de alegrias e tristezas passadas. Tudo o que contribuiu ou dificultou é transfundido por uma magia sutil em sua própria essência. Ela se torna mais luminosa e preciosa à mediada que o tempo passa, ao ser carregada perto do calor do coração pulsante. Então, finalmente, enquanto eu estava pensando sobre a pérola e seu significado, ouvi o final da história do Outro Sábio.