Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.
Núñez de Balboa, 56
28001 Madrid
© 2012 Abby Green. Todos os direitos reservados.
LENDA DE PAIXÃO, N.º 1432 - Dezembro 2012
Título original: The Legend of de Marco
Publicado originalmente por Mills & Boon®, Ltd., Londres.
Publicado em português em 2012
Todos os direitos, incluindo os de reprodução total ou parcial, são reservados. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Enterprises II BV.
Todas as personagens deste livro são fictícias. Qualquer semelhança com alguma pessoa, viva ou morta, é pura coincidência.
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I.S.B.N.: 978-84-687-1330-4
Editor responsável: Luis Pugni
Conversão ebook: MT Color & Diseño
www.mtcolor.es
Rocco de Marco olhou à sua volta e sentiu-se feliz. Estava numa sala linda, num museu muito prestigiado, no centro de Londres. Fora desenhado por um famoso arquiteto de art déco nos anos vinte e recebia a visita de milhões de turistas que queriam admirar os seus vitrais espetaculares.
A multidão também era exclusiva: políticos de alto gabarito, comentadores dos meios de comunicação, celebridades de todo o tipo e filantropos milionários que controlavam os mercados de todo o mundo apenas levantando um dedo ou arqueando um sobrolho. Rocco, de trinta e dois anos, estava nessa última categoria e, por isso, era alvo de todos os olhares. Um silêncio especulativo abatia-se sobre ele, todos se perguntavam como se tornara intocável em tão pouco tempo.
De repente, reparou numa loira alta e elegante que estava do outro lado do salão. Usava o cabelo apanhado num coque clássico e os seus olhos eram tão azuis como altivos. No entanto, a sua expressão suavizava-se sob o olhar de Rocco. Usava maquilhagem, mas o rubor autêntico não lhe chegava às faces. Vestia um vestido preto rutilante e, de alguma forma, Rocco sabia que era tão dura como os diamantes que brilhavam no seu peito e nas suas orelhas. Ela sorriu e levantou o copo olhando para ele.
Uma sensação triunfal percorreu Rocco. Levantou o seu copo e também a cumprimentou. A ideia de cortejar a distinta menina Honora Winthrop corria pelas suas veias como um néctar. Era o momento. Por fim, estava no topo, tinha chegado onde sempre quisera estar, depois de tanto esforço. Nunca teria imaginado que se encontraria naquela situação, a desempenhar o papel de anfitrião para uma multidão como aquela, fazendo parte dela.
Por fim, estava suficientemente longe daquela infância marginal vivida numa cidade italiana, longe daquele menino selvagem da rua. Aquele menino não tinha saída. O seu próprio pai pusera-o na rua e as suas meias-irmãs tinham passado por ele sem sequer o olharem. Mas ele abrira caminho com unhas e dentes até ao topo, com coragem, determinação e inteligência. E, até àquele momento, ninguém conhecia o seu verdadeiro passado.
Deixou o seu copo vazio na bandeja que um empregado segurava, mas não o substituiu por outro cheio. Manter a cabeça limpa era a sua primeira regra de ouro. De repente, recordou aquela tatuagem áspera que tivera durante anos e que tirara. Fora umas das primeiras coisas que fizera ao chegar a Londres, há quase quinze anos. Ao pensar nisso, sentiu um formigueiro estranho na pele.
Afastou aqueles pensamentos e dirigiu-se com decisão para a menina Honora Winthrop. Durante um breve instante, sentiu uma claustrofobia repentina, mas conseguiu controlá-la. Estava onde queria estar, no sítio onde tanto lhe custara chegar.
Esforçou-se para apresentar a sua melhor cara. Porque é que ainda tinha de se esforçar?
Rocco sentiu-se incomodado consigo mesmo...
De repente, reparou numa jovem solitária. Era evidente que não era tão vistosa ou glamorosa como as outras mulheres. O vestido não lhe ficava muito bem e o seu cabelo era uma massa vibrante vermelha. Havia algo indomável e irreverente nela, algo que lhe chamava poderosamente a atenção.
Rocco esqueceu o seu propósito inicial quase sem se dar conta. Não conseguia desviar o olhar daquela jovem misteriosa. Antes que soubesse o que estava a fazer, mudou de rumo e dirigiu-se para ela.
Gracie O’Brien tentava comportar-se com indiferença e descontração, como se estivesse habituada a ser convidada para as festas mais glamorosas de Londres. Mas era difícil... Sobretudo, para uma empregada de bar. Ela estava habituada ao tipo de sítios onde os homens lhe beliscavam o rabo e lhe diziam coisas desagradáveis. Apertou os dentes quase inconscientemente. Uma licenciatura em Belas Artes não servia de muito num mundo dominado pela economia, mas ela tinha um sonho. No entanto, infelizmente, para financiar esse sonho tinha de ganhar a vida, comer e sobreviver, algo difícil com um trabalho precário.
Gracie afastou aquelas reflexões nocivas abanando a cabeça. Conseguia desenrascar-se com aqueles trabalhos precários. Conseguia enfrentar a situação. Apertou a mala de festa com força contra o abdómen. Para onde tinha ido Steven? Tinha-o acompanhado para lhe fazer um favor... Apertou os lábios. A tensão consumia-a num ambiente como aquele... E a preocupação que sentia por ele também.
Fez um esforço para relaxar. Aquela gala de beneficência era organizada todos os anos pela empresa para a qual o seu irmão trabalhava e tinha-se tornado um grande acontecimento para ele... Daí as mudanças de humor e aquele nervosismo... Ambos tinham vinte e quatro anos e Gracie já não podia continuar a sentir-se responsável por ele. Já não podia continuar a cuidar dele como fizera toda a vida. Ainda tinha as cicatrizes das lutas em que se metera para o defender de algum valentão. Para proteger o seu irmão mais novo, apenas vinte minutos mais novo do que ela.
Antes de os abandonar, a sua mãe sempre lhes tinha recordado muito bem que o querido filho estivera prestes a morrer, enquanto ela, Gracie, tivera a ousadia de crescer saudável e forte.
«Levá-lo-ia comigo, se pudesse. Ele foi o único que sempre amei. Mas é muito apegado a ti e não posso encarregar-me de um menino mimado.»
Gracie reprimiu a onda de emoção que a embargou de repente, que a invadia sempre que recordava aquele dia. Suspirou ao ver o seu irmão ao longe. O seu coração encheu-se de amor por ele. Tinham passado por muitas coisas desde aquele dia, mas sempre tinham velado um pelo outro. A debilidade de Steven fora tão grande, que nem sequer ela tinha conseguido salvá-lo durante anos, mas as coisas tinham mudado. Ele tinha voltado à carga.
«Por favor, Gracie, a sério que quero que me acompanhes... Todos vão levar as suas esposas. Não posso destoar. Sabes como é importante ter conseguido emprego na De Marco International.»
E, depois, tinha voltado a fazer o discurso de sempre sobre o magnífico Rocco de Marco. Tanto que Gracie não tivera outro remédio senão ouvi-lo a elogiar aquele homem que não podia ser humano porque era demasiado perfeito. E também o tinha escutado porque vira como estava ansioso, e porque sabia como trabalhara para ter uma oportunidade. Longas horas na prisão, a estudar, para acabar o ensino secundário e poder entrar na universidade assim que saísse... O medo constante de que pudesse recair nas drogas...
Mas isso não acontecera. Por fim, o seu talento extraordinário e a sua inteligência estavam a servir para algo. Estava a falar com outro homem. Olhando para ele, ninguém diria que era seu irmão. Steven era alto e magro. Gracie media pouco mais de um metro e meio e a sua figura infantil sempre a tinha envergonhado. Era ruiva, com sardas e olhos castanhos. Tinha saído ao seu pai irlandês. Outra razão pela qual a sua mãe a odiava...
Fez uma careta ao ver que o vestido lhe caía um pouco no peito, deixando o descoberto mais um centímetro de pele no decote. Nada do outro mundo. Comprara o vestido naquela tarde, numa loja de roupa em segunda mão, e nem sequer se incomodara em prová-lo. Um grande erro... O vestido era, pelo menos, dois números acima do dela.
Fartou-se de esperar por Steven. Devia estar muito ocupado. Virou as costas à multidão e agarrou o vestido. Viu uma mesa repleta de pratos cheios de canapés. De repente, teve uma ideia.
Dirigiu-se para aqueles manjares deliciosos e, então, ouviu uma voz ao seu lado.
– A comida não vai acabar, sabias? A maioria das pessoas que estão aqui não come há anos.
Aquela observação cínica flutuou no ar por cima de Gracie. A jovem ruborizou-se violentamente e agarrou com força o canapé que acabava de embrulhar num guardanapo para o guardar na mala. Já era o quarto. Olhou para a sua esquerda, de onde provinha a voz. Deparou-se com uma camisa branca imaculada, um laço... E, então, viu o homem mais atraente que já vira na sua vida. O canapé caiu-lhe da mão e foi parar diretamente à mala. Ficou encantada, hipnotizada. Uns olhos escuros brilhavam naquele rosto grosseiramente bonito. Gracie quase teve vontade de fazer uma reverência. Aquele desconhecido emanava um carisma escandalosamente sexual.
– Eu... – não conseguia falar.
Fez-se silêncio.
– Tu...? – ele arqueou um sobrolho e esboçou um sorriso.
O olhar de Gracie foi parar àqueles lábios perfeitos. Havia algo tão provocadoramente sensual naquela boca, como se tivesse sido feita para beijar e só para beijar. Qualquer outra coisa teria sido um desperdício.
Com a cara a arder de vergonha, Gracie levantou novamente o olhar para aqueles olhos pretos. Estava consciente de que aquele homem era muito alto, a largura das suas costas quase intimidava. Tinha o cabelo grosso e preto, com uma madeixa encaracolada que lhe caía sobre a testa. Dava-lhe um ar travesso que melhorava aqueles traços duros e altivos. Aquele desconhecido tinha um porte soberbo, régio. Tinha as mãos enfiadas nos bolsos com descontração.
Gracie conseguiu baixar por fim os olhos.
– A comida não é para mim. É para...
Procurou desesperadamente uma desculpa e, então, pensou no que Steven diria se a expulsassem dali por causa daquilo. Voltou a olhar para ele.
– É da segurança? – perguntou-lhe, com prudência.
Quase ao mesmo tempo que as palavras saíam da sua boca, Gracie soube que deveria ter-se mantido em silêncio. Decorreu uma fração de segundo e ele pôs-se a rir. A vergonha fê-la responder com contundência.
– Também não é para tanto. Como poderia saber quem é?
O homem deixou de se rir, mas os seus olhos brilharam, despertando a raiva de Gracie. Ela sabia que estava a reagir ao efeito peculiar que ele estava a ter no seu corpo. Nunca se tinha sentido assim. Apesar do calor que havia no salão, estava arrepiada. Os seus sentidos estavam mais despertos do que nunca. Podia ouvir o seu coração a pulsar estrondosamente. E tinha calor, como se estivesse a arder por dentro.
– Não sabes quem sou?
Uma grande incredulidade desenhou-se no rosto perfeito do desconhecido. Embora, na realidade, não fosse para tanto. Gracie olhou-o com mais atenção e apercebeu-se de que tinha o nariz ligeiramente torto, como se lho tivessem partido, e pequenas cicatrizes numa face. No outro lado da cara, tinha outra cicatriz que ia do queixo até à têmpora.
Gracie estremeceu, como se tivesse reconhecido algo naquele homem a um nível muito primário e instintivo, como se partilhassem algo... Absurdo! A única coisa que podia partilhar com um homem como ele era o ar que respiravam. A pergunta dele devolveu-a à realidade.
Levantou o queixo.
– Bom, não sou adivinha. E você não tem uma etiqueta com o nome, portanto, como posso saber quem é?
Ele fechou a boca e apertou os lábios, como se tentasse reprimir uma gargalhada. Gracie, por seu lado, teve de reprimir a vontade de lhe dar um murro.
– Quem é, se é que é tão importante que toda a gente deveria conhecê-lo?
Ele abanou a cabeça e ficou sério de repente. Gracie voltou a tremer. Havia um brilho especulativo no seu olhar. Por detrás daquele encanto escondia-se algo muito menos benévolo, algo obscuro...
– Porque não me dizes quem és tu?
Gracie abriu a boca, mas, naquele momento, um homem interpôs-se entre eles e dirigiu-se ao desconhecido misterioso, ignorando Gracie:
– Senhor de Marco, já estão prontos para o seu discurso.
Gracie ficou perplexa. Senhor de Marco? O homem com quem acabava de falar era Rocco de Marco... Pela forma como Steven o descrevera, sempre tinha imaginado alguém muito mais velho, de baixa estatura, gordo, sempre a fumar um charuto... Mas o homem que tinha diante dela devia ter trinta e poucos anos...
Quando o homem que os tinha interrompido partiu, Rocco de Marco aproximou-se de Gracie. O seu aroma atingiu-a imediatamente. Era almiscarado e muito masculino. Ele estendeu uma mão e, ainda surpreendida, ela levantou a dela. Sem deixar de olhar para ela, ele inclinou-se e deu-lhe um beijo na mão. Ao sentir o roçar dos seus lábios na mão, Gracie sentiu que o coração lhe disparava e que o sangue começava a correr-lhe mais rápido pelas veias.
Ele endireitou-se e largou-lhe a mão. Já não estava a especular. Estava a ser sedutor, insinuante.
– Não te vás embora, está bem? Ainda não me disseste quem és.
Então, depois de lhe dedicar um olhar abrasador, deu meia volta e perdeu-se entre a multidão. Nesse momento, Gracie pôde respirar novamente. Observou-o de longe. Era mais alto do que a maioria das pessoas, que se afastavam à sua passagem para lhe facilitar o caminho. Costas largas, ancas estreitas... Perfeição.
Era Rocco de Marco, homem de negócios, milionário, uma lenda viva. Alguns chamavam-lhe «génio». Procurou o seu irmão com o olhar e encontrou-o. Steven olhava para Rocco como se estivesse hipnotizado. Sem saber muito bem porque era tão importante sair dali, Gracie soube que tinha de partir. A ideia de voltar a encontrar-se com aquele homem era perturbadora. A sua falta de aprumo envergonhava-a. A pele das mãos ardia-lhe. Toda a gente que estava naquela sala devia saber quem ele era. Todos menos ela. As joias que as mulheres usavam eram verdadeiras, não eram falsas como as suas. Não pertencia àquele lugar.
Pensou no que acontecera pouco antes. O homem mais importante da sala vira-a a roubar canapés e a guardá-los na mala. De repente, imaginou o seu irmão a apresentar-lho. Ficou pálida só de pensar nisso. Steven morreria de vergonha se Rocco de Marco dissesse alguma coisa. Talvez inclusive tivesse problemas. O sentido da responsabilidade apoderou-se dela e, então, fez a única coisa que podia fazer: fugiu.
Rocco de Marco examinou o artigo que lhe tinham dedicado no suplemento financeiro do jornal e fez uma careta. A caricatura da sua cara tornava-o mais masculino e sinistro. Mas, quando viu a sua fotografia junto da belíssima Honora Winthrop, sentiu uma descarga de satisfação. Sabia que faziam um belo casal. A fotografia fora tirada na gala de beneficência organizada pela sua empresa no London Museum, na semana anterior. Naquela noite, embarcara numa campanha com a qual pretendia consagrar o seu lugar na alta sociedade de forma permanente. E isso só se conseguia à base de sedução...
O seu sorriso tornou-se duro e desumano ao recordar o entusiasmo da menina Winthrop. Poderia facilmente tê-la levado para a cama. Mas, até ao momento, resistira-lhe aos encantos. Naquela noite, tinha decidido que o seu objetivo seria casar-se com ela e o sexo não podia arruinar-lhe o plano. O seu sorriso desvaneceu-se quando reconheceu que não lhe custara muito resistir.
De repente, a lembrança de uma ruiva baixa e esperta apresentou-se na sua memória. A imagem foi tão vívida que o fez levantar-se da cadeira onde estava sentado. Parou à frente da janela panorâmica do seu escritório, que oferecia a melhor vista de Londres.
Apertou os dentes, afastando a lembrança com contundência. Depois de fazer aquele discurso, em vez de se dirigir para Honora, fora procurar aquela jovem misteriosa, mas ela tinha desaparecido. Ainda podia recordar como se surpreendera, indignado. Ninguém, e muito menos uma mulher, fugia dele daquela maneira. Nos quinze anos que levava fora de Itália, jamais se tinha desviado dos seus planos, sempre cuidadosamente forjados... Jamais... Até àquele dia. E ela nem sequer era bonita, mas tinha algo... Algo nela tinha apelado aos seus instintos mais primários.
Passara a noite quase toda a procurá-la, sem deixar de pensar naquele encontro fortuito. Já deveria estar a anos-luz daquela vida passada. Estava prestes a subir o degrau decisivo que o levaria à esfera mais alta, ao estrato mais elitista, para longe do passado.
Rocco esfregou a nuca. Aquele momento de introspeção tão intenso devia-se ao problema de segurança que tinha havido recentemente na sua empresa. Fora descoberto rapidamente, mas fizera-o abrir os olhos, fizera-o dar-se conta de como estava a tornar-se perigosamente complacente.
Tinha contratado Steven Murray um mês antes, simplesmente porque lhe transmitira boas vibrações, o que não era uma prática habitual nele. Mas deixara-se impressionar pela gana e pela inteligência do rapaz... E algo nele lhe tinha recordado o jovem empreendedor e lutador que fora em tempos. O seu currículo não dizia muito, mas tinha decidido dar-lhe uma oportunidade.
E Steven Murray pagara-lha transferindo um milhão de euros para uma conta impossível de localizar e esfumara-se da face da Terra. Só tinha passado uma semana desde a festa da empresa. Fora como uma bofetada na cara e recordou-lhe que não podia permitir-se baixar a guarda nem por um segundo.
Todos lhe virariam as costas se se mostrasse como um empresário fraco e vulnerável. E, se isso chegasse a acontecer, Honora Winthrop olhá-lo-ia com desprezo e jamais aceitaria um pedido de casamento. Há muito tempo que tinha o controlo absoluto e, de repente, dera-lhe para seduzir mulheres com vestidos baratos e contratar empregados por instinto. Estava a pôr em perigo tudo aquilo pelo qual tanto tinha lutado. O dinheiro tornava-o poderoso, mas a aceitação social era a única coisa que poderia mantê-lo no poder para sempre. Aquela pequena racha que tinha aparecido na sua armadura preocupava-o muito. Já começavam a sentir curiosidade a respeito do seu passado e não queria dar nenhum motivo à imprensa sensacionalista para que aprofundasse o seu passado. A sua equipa de segurança não tinha conseguido encontrar Steven Murray... Mas não descansaria enquanto não dessem com ele para lhe dar o seu castigo.
Rocco virou as costas à janela e agarrou no casaco. O crepúsculo abatia-se sobre a cidade e todos os escritórios já estavam vazios. Normalmente, era a sua altura preferida para trabalhar, quando toda a gente já saíra. Gostava de ouvir o silêncio. Era reconfortante. Era muito diferente da cacofonia ensurdecedora da sua juventude. Justamente quando ia sair do escritório, tocou o telefone. Deu meia volta e atendeu-o. Escutou o que lhe dizia a pessoa que estava do outro lado da linha e ficou tenso imediatamente.
– Tragam-na aqui! – disse, quase cuspindo as palavras.
Foi para o elevador e viu como se iluminavam os números dos andares. Alguém andava à procura de Steven Murray. O elevador parou e, justamente antes de as portas se abrirem, Rocco sentiu que o coração lhe disparava, como se algo importante estivesse prestes a acontecer.
As portas abriram-se por fim. Diante dele apareceu uma jovem baixa, com uma t-shirt cinzenta, umas calças de ganga velhas e uma espécie de camisola de lã atada à cintura. O cabelo vermelho apanhado numa trança caía-lhe sobre um ombro, chegando quase até aos seus seios. Tinha a cara pálida, em forma de coração. As sardas notavam-se-lhe mais do que nunca. Os seus olhos, enormes e castanhos, tinham reflexos dourados e verdes.
Não demorou um segundo a reconhecê-la. Sem saber muito bem o que fazia, agarrou-a pelos braços e puxou-a.
– Tu!